20 Março 2023
"Europeus e estadunidenses não desejam se opor a Israel, e suas críticas sempre foram atenuadas por declarações de amizade e fidelidade. Mas se o governo de Tel Aviv sair claramente do campo democrático, correrá o risco de destruir esse vínculo emocional que tem suas raízes no Holocausto e nos mitos fundadores de Israel", escreve Pierre Haski, em artigo publicado por Internazionale, 16-03-2023. A tradução é de Luisa Rabolini.
A reforma judicial proposta pelo governo de extrema-direita liderado por Netanyahu é acusada de ser antidemocrática por um amplo movimento de oposição. Os países ocidentais aliados de Israel estão numa situação embaraçante.
Qual país do mundo acabou de se recusar a receber Josep Borrell, chefe da diplomacia Europeu? O ministro das finanças de qual país viaja para os EUA e a França sem o mínimo contato com os governos dos dois países?
Estranho dizer, mas este país é Israel, certamente não acostumado a ser considerado quase um pária no mundo ocidental. Claro, o primeiro-ministro Benjamin Netanyahu foi recebido em Paris pelo Presidente da República Emmanuel Macron e em Roma pelo primeira-ministra Giorgia Meloni, e está atualmente em Berlim para se encontrar com o chanceler Olaf Scholz.
Mas mesmo que o chefe de governo, que tem em sua bagagem décadas de relacionamentos pessoas com os líderes europeus e estadunidenses, seja recebido no exterior, nem sempre recebe comentários agradáveis sobre as escolhas de seu governo.
No centro dos problemas está a crise política desencadeada pela coalizão que Netanyahu formou com a extrema direita israelense, autora de uma reforma judiciária que segundo grande parte da sociedade israelense é antidemocrática. Os protestos que duram há semanas constituem um movimento de oposição nacional.
Sempre poderíamos julgar compreensível o fato de Josep Borrell ter encontrado a porta fechada em Israel depois de ter criticado, no Parlamento Europeu, a política de colonização na Cisjordânia incentivada pelo governo israelense; ou que Bezalel Smotrich, Ministro das Finanças e líder de um partido de extrema-direita residente no assentamento de Kedoumim, na Cisjordânia, seja boicotado pelas autoridades durante suas visitas ao exterior.
Mas resta o fato é que há um verdadeiro embaraço apenas três meses após a formação do novo governo. O executivo israelense não perdeu tempo antes de implementar seu programa de reformas judiciais, tentando impor a pena de morte por terrorismo em um país que a aplicou apenas uma vez em sua história, contra o nazista Adolf Eichman.
As manifestações da extrema-direita como aquelas do ministro Smotrich tornam difícil fechar os olhos, mesmo para países que sempre hesitaram diante da possibilidade de criticar o Estado judeu, por razões históricas ou para não alimentar o antissemitismo.
É provável que essa deterioração se agrave? A resposta depende de dois fatores. O primeiro é a crise política israelense: ela vai piorar ou será amenizada? Em 15 de março, uma proposta de compromisso apresentada pelo presidente israelense Isaac Herzog foi rejeitada pelos partidos da coalizão, sugerindo uma crise ainda mais aguda.
O segundo fator é a guerra na Ucrânia, que não tem relação com a situação israelense, mas que alimenta a suspeita em todo o mundo de que os ocidentais apliquem "dois pesos e duas medidas" dependendo da crise. No caso específico, o Ocidente mostra-se inflexível em relação à Rússia depois de ter tolerado durante décadas o descumprimento das resoluções das Nações Unidas no caso dos palestinos.
Europeus e estadunidenses não desejam se opor a Israel, e suas críticas sempre foram atenuadas por declarações de amizade e fidelidade. Mas se o governo de Tel Aviv sair claramente do campo democrático, correrá o risco de destruir esse vínculo emocional que tem suas raízes no Holocausto e nos mitos fundadores de Israel.
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Israel. A crise política israelense pesa nas relações com o Ocidente - Instituto Humanitas Unisinos - IHU